“ O que levou ao fim da Idade da Pedra não foi a falta de pedras”.
Esta frase, que terá sido dita há alguns anos por um “sheik” árabe ligado ao petróleo, pretendia acalmar os receios sobre o futuro da indústria petroquímica num cenário de esgotamento dos hidrocarbonetos fosseis.
Esta frase é interessante e não se destrói pelo argumento óbvio da diferença, em termos de dimensão de reservas, entre as pedras e os hidrocarbonetos fósseis. O que o “sheik” pretendia dizer é que ao longo da História os materiais foram sendo substituídos pelo avanço da tecnologia e não pelo seu esgotamento. Na verdade a pedra perdeu a importância no fabrico de utensílios quando o Homem aprendeu a extrair e a processar os metais, e os metais, sem deixarem de ser indispensáveis para alguns usos, perderam o lugar para muitos outros com o desenvolvimento de substancias sintéticas baseadas na química do Carbono (vulgo “plásticos”).
A fragilidade da frase como argumento tranquilizador está no facto de, à luz do actual desenvolvimento tecnológico, parecer francamente optimista pensar que os “plásticos” podem vir a ser substituídos dentro do horizonte temporal que mesmo os mais optimistas prevêem para a duração das reservas de petróleo e de gás natural.
O desenvolvimento da indústria petroquímica na segunda metade do século XX foi um dos mais extraordinários feitos da Humanidade. Isto não será um facto adquirido para a maior parte das pessoas apenas porque não existe ainda tempo suficiente para lhe ser dada uma perspectiva histórica. Mas se olharmos o nosso quotidiano, vemos que é praticamente impossível desenvolver qualquer actividade, por mais trivial que seja, sem recorrer a um material baseado na Química do Carbono e que, há menos de 100 anos, pura e simplesmente não existia. E não é só ter em consideração a questão do preço e da facilidade de construção. É a própria existência do objecto que estaria em causa (já pensaram o que seria um telemóvel construído apenas por metais, cerâmica e madeira?).
Indo um pouco mais à Química, este progresso foi possível pela feliz conjugação de dois factores: a variedade de substancias que é possível produzir recorrendo a um “esqueleto” baseado no átomo do Carbono e a disponibilidade na Natureza de grandes quantidades de produtos gasosos e líquidos (gás natural e petróleo) cujas moléculas são baseadas em átomos de Carbono e Hidrogénio, sabendo que a ligação entre estes dois átomos é facilmente “trabalhável” em termos de química industrial. É mesmo opinião de muitos economistas com uma visão mais profunda da ciência e da técnica (o que nem sempre acontece…) que o desenvolvimento económico sem precedentes ocorrido após a 2º Guerra Mundial se ficou a dever a esta conjugação feliz de factores, acrescentada ao facto das ligações Carbono – Hidrogénio, existentes nos mesmo produtos, serem só por si um manancial de energia cómoda e barata.
E é por este último factor (a energia cómoda e barata contida na ligação Carbono –Hidrogénio) que as coisas se complicam. Os recursos de hidrocarbonetos naturais têm vindo a ser explorados de uma forma sem precedentes na história da Humanidade para a produção de energia e as ligações Carbono - Hidrogénio são destruídas essencialmente para esse fim. E a questão é que, enquanto a produção de energia pode ser alcançada por outros meios (embora mais caros, mais incómodos ou mais perigosos, ou com estes três inconvenientes em simultâneo), a utilização dos hidrocarbonetos como materiais básicos está longe de ter um sucedâneo à vista, o que nos remete para as dúvidas em relação à frase inicial do “sheik” do petróleo.
Irá mesmo acabar a Idade da Petroquímica por falta de hidrocarbonetos fósseis?
A exploração desta questão e a dos sucedâneos dos actuais “plásticos” levaria muito longe, mas uma coisa parece evidente: vai haver uma altura que os hidrocarbonetos vão ser “racionados” para a utilização como matéria-prima. E isto não pela via duma regulação, impossível à escala global, mas sim pela via económica. Isto é, o seu preço vai ser tão elevado que a produção de energia terá de recorrer a outros processos. Claro que os objectos feitos de “plásticos” vão subir de preço, e muitos irão passar a ser feitos recorrendo a outros materiais (o que não será o caso dos telemóveis, onde a incidência do preço do material de construção não é relevante).
Se calhar no fundo vai acontecer como com o fim da Idade da Pedra. Ainda hoje a pedra é incontornável para fazer muitas coisas consideradas indispensáveis. Basta pensar do Centro Cultural de Belém.
Sem comentários:
Enviar um comentário