quarta-feira, 6 de abril de 2011

É altura de festejar!

 Este é o post nº  100
É uma boa oportunidade para festejar! Com um bolo.

  Há pessoas que fazem bolos muti giros: 
http://media.cakecentral.com/gallery/645844/normal_1255974383.JPG

Mas um bolo tem muita química...
Seja qual for a receita que escolher há ingredientes que estão sempre presentes: a farinha, o fermento, o açúcar e os ovos. Vejamos como contribuem para a textura e o sabor final do bolo.

A farinha
Na farinha de trigo existem vários tipos de compostos, sendo os mais relevantes o amido e as proteínas.
O amido - cerca de 70% da farinha - é constituído por cadeias de um açúcar – a glucose; umas cadeias são ramificadas – a amilopectina – e outras lineares – a amilose. Estas cadeias formam uma estrutura semi-cristalina, bem resistente, que se denomina grânulo.
Quando o amido é aquecido na presença de água, e a temperatura atinge cerca de 60º, as ligações entre as moléculas de amilose e amilopectina da farinha tornam-se mais fracas, a água penetra nos grânulos de amido, estes incham e forma-se um complexo gelatinoso com a água.


As proporções dos vários componentes da farinha podem variar e, no caso das proteínas, a sua presença varia de cerca de 8% até 14%. Quando se junta à farinha um líquido, como água, leite ou até os ovos, estas proteínas vão ligar-se entre si e formar uma rede, a que se chama glúten, que é forte e elástica. Consoante a preparação culinária que está a fazer é desejável ou não que esta rede se forme. Ela é fundamental no pão, mas não num bolo, pois torná-lo-ia duro. 
A farinha que se vende com fermento, própria para bolos, tem um baixo teor proteínas para evitar a formação desta rede. Já reparou também que nas receitas de bolos lhe dizem para juntar a farinha no fim, depois do bolo bem batido. O objectivo é mais uma vez evitar que as proteínas se liguem entre si e se forme  o glúten.
 
O fermento
Quanto ao fermento, seja adicionado em separado ou já misturado com a farinha, tem como função fazer crescer o bolo. Ele é composto por uma base (bicarbonato de sódio) e um ácido em quantidade suficiente para reagirem entre si. O fermento em pó tem também amido que serve para manter estes dois componentes separados e secos, impedindo assim que reajam. Quando se mistura o fermento com um líquido contendo água dá-se uma reacção química, que é mais rápida a quente, entre o bicarbonato e o ácido e novos produtos se formam.

bicarbonato de sódio + ácido  ---->  sal + dióxido de carbono + água

O aspecto mais importante desta reacção é a formação de dióxido de carbono, um gás, que vai contribuir para tornar os bolos mais leves.
  
O açúcar
O açúcar, além da sua função mais óbvia de adoçante, também vai contribuir para que o bolo fique com uma textura mais macia e húmida. 

As moléculas de açúcar (sacarose) têm grande afinidade com as moléculas de água, ligando-se a elas, e mantêm-nas nos bolos não os deixando secar. 
 O açúcar também torna menos fácil a interligação das proteínas da farinha. Por outro lado, atrai as moléculas de água, deixando-as menos disponíveis para interactuarem com o amido. Assim o bolo solidifica mais tardiamente dando tempo para o fermento actuar e o bolo ficar mais esponjoso. Quando se reduz a quantidade de açúcar numa receita o bolo fica mais denso e seco.
E se quiser cobrir o bolo com um fondant é necessária alguma experiência para obter bons resultados... É a afinidade do açúcar com a água que torna possível a formação de xaropes, e em particular de xaropes tão concentrados como os que são necessários para o fondant. Em seguida, todo o processo envolvido consiste em criar condições para que o açúcar cristalize formando milhões de cristais bem pequenos que deixam o fondant com as características que tanto aprecia.

 

Os ovos


Os ovos têm uma propriedade invulgar: à temperatura ambiente, são líquidos; mas, quando são sujeitos à acção do calor, solidificam!

A sua composição química média é a seguinte:


Água
Proteína
Gordura
Cinza
Clara
88,0 %
11,0 %
0,2 %
0,8 %
Gema
48%
17,5 %
32.5 %
2,0 %

Podemos imaginar as proteínas do ovo como fios, que se encontram normalmente enrolados em forma de novelo. As proteínas, com o aquecimento, desnaturam - desenrolam-se e ligam-se entre si  formando uma rede - e o ovo coagula. 


Os ovos são quase sempre bem batidos, para incorporar ar na massa do bolo e o tornar mais leve. Frequentemente as claras são batidas em castelo. Quando o faz está a formar uma espuma, isto é uma dispersão de bolhas de ar num líquido. Esta espuma forma-se facilmente e é relativamente estável devido à viscosidade da clara e porque quando se bate ocorre a desnaturação de algumas das proteínas da clara do ovo (albuminas) o que contribui para reforçar a espuma. 


Para obter umas boas claras em castelo, os ovos não devem vir do frigorífico. A quantidade de ar que é possível incorporar, e a estabilidade de uma espuma, dependem das forças atractivas que cada molécula exerce sobre as moléculas vizinhas (tensão superficial) do líquido que é batido. A temperaturas mais altas as moléculas têm mais mobilidade e estão mais afastadas umas das outras, sendo mais fácil incorporar ar nas claras e ficando a espuma mais estável.
Um pouco de gema (1/3 da gema é gordura) a contaminar as claras impede que se obtenham umas claras em castelo estáveis. O mesmo acontece se a tigela estiver suja com alguma gordura (por isso não se devem bater claras em tigelas de plástico, donde é difícil retirar toda a gordura). As moléculas de gordura dificultam a desnaturação das proteínas da clara e a ligação destas entre si, dificultando assim a formação da rede em volta das bolhas indispensável para uma espuma estável.

E ao meter no forno...
Quando mete o bolo no forno está a fornecer energia para que se dêem uma série de reacções químicas que já foram referidas: a reacção dos componentes do fermento que produz dióxido de carbono e a gelatinização do amido e a coagulação das proteínas que fazem com que a massa do bolo solidifique. Simultaneamente o ar incorporado ao bater, e o dióxido de carbono que se forma, quando são aquecidos expandem e o bolo ainda cresce mais...
Mas ainda falta falar do que acontece na camada exterior do bolo. Aí a temperatura é mais elevada e a água, aquecida a uma temperatura muito superior à da sua ebulição, vaporiza-se. Forma-se assim uma camada mais seca e estaladiça e suficientemente impermeável para reter o vapor que se forma no interior. Esta fica também com uma bela cor dourada que é o resultado de uma série de reacções químicas complexas, chamadas reacções de Maillard que se dão entre os açúcares e as proteínas. Estas reacções produzem moléculas que, além da cor, também dão um sabor agradável.

E com esta pitada de ciência vai certamente olhar para um bolo de uma outra forma...

1 comentário:

  1. Parabéns.
    Um blog que tem mantido um grande nível, sempre com curiosidades muito interessantes.
    Obrigada

    ResponderEliminar