domingo, 26 de junho de 2016

Química na Arte XXXVII





Ironia ao Natural

É natural,
é bom
e quanto mais melhor,
como os cogumelos
vermelhos,
as rãs azuis
ou o suco de serpente...
É químico,
processado,
é mau,
como a
aspirina,
um perfume
ou o plástico
da válvula
cardíaca
de um coração...


João Paiva
Ilustração de Afonso Paiva 

(Publicado simultâneamente no meu outro blog Assins & Assados)


sexta-feira, 24 de junho de 2016

O que é natural nem sempre é bom






Há coisas que de tão intuitivas, virtuosas até, parecem uma verdade indiscutível… Mas serão? Muitas não.

“Come que é tudo natural!”

Se me dizem isto apetece-me logo perguntar: O que é que significa natural? O que é que isso garante? Significa que é mais saudável?

De facto, o que é considerado "natural", são por vezes coisas bem diferentes. Algumas altamente processadas. E será mau o facto de serem processadas? Não necessariamente.

Quanto às coisas naturais serem saudáveis… Infelizmente as coisas não são tão simples. É sempre preciso mais conhecimento, mas conhecimento bem fundamentado, em fontes credíveis. Os venenos mais potentes existem na natureza, e o homem até aprendeu a evitá-los ou, empiricamente, a eliminá-los. O caso da mandioca brava é um bom exemplo. É muito rica em cianeto, e alguns povos desenvolveram ao longo de séculos técnicas para a processar e eliminar o cianeto de forma a poderem consumi-la, é fascinante. Ou seja, a mandioca tem que ser altamente processada para se tornar num alimento saudável.

Num mundo não muito seguro, e em que a informação que nos chega é por vezes complexa e confusa, recorremos a várias âncoras, como esta do "natural", para criar zonas de segurança. Mas podem ser falsas zonas de segurança. A indústria e o comércio exploram esta, nem sempre justificada, associação entre o natural, o saudável e o seguro para vender. A imprensa bombardeia-nos com informação sem nenhum fundamento sobre os benefícios do “natural” versus um também mal definido “processado”.

Nem sempre o que parece é, e nem sempre o que é intuitivo é verdade. É urgente que se invista mais em educação e que estes conceitos comecem a ser clarificados na escola, talvez assim dentro de alguns anos os consumidores sejam mais informados, críticos e exigentes e façam escolhas mais racionais.

Imagem DAQUI


Post inicialment publicado no blog Assins & Assados

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Mel cremoso, uma invenção genial

mel3.jpg


Não sou uma pessoa muito observadora. Tenho pena, porque há coisas interessantes que me escapam completamente. Há uns anos, num pequeno almoço num hotel em Copenhaga, disseram-me "Já reparaste que o mel é cremoso e que dá para barrar?". Não, não tinha reparado... E a pergunta seguinte foi "O que é que eles adicionarão ao mel para ficar assim?". Não sabia, mas fiquei com curiosidade. Não fosse dar jeito... meti 2 ou 3 doses de mel na carteira. Foi a minha sorte!

A Patrícia de vez em quando diz "O google é o nosso melhor amigo." E tenho que lhe dar alguma razão. Cheguei, googlei e logo descobri que era apenas mel que tinha sido cristalizado. De facto, o mel é uma solução sobressaturada de açúcar, em geral mais de 70% de açúcar e menos de 20% de água, e sendo assim é instável. Por isso frequentemente cristaliza.

Honey-Pie.jpg

Os principais açúcares no mel são a frutose e a glucose, em geral um pouco mais de frutose do que de glucose. O açúcar que cristaliza é a glucose, pois a sua solubilidade em água  (910 g/L a 25 ºC) é menor que a da frutose (3750 g/L a 20 ºC), sendo esta mais difícil de cristalizar.

Ainda há dias fui dar com uma embalagem de um mel que quando comprei era fluido e agora, com o tempo mais frio, tinha cristalizado. Quando isto acontece o mel pode ficar menos agradável de comer, se os cristais forem grandes vão tornar o mel arenoso. No entanto, se os cristais forem muito pequenos, o mel fica transformado num creme com uma textura muito agradável, e que dá para barrar. Tem ainda a vantagem de não se sujar tudo à volta com pingos de mel.

O que fazem alguns produtores de mel, é cristalizarem o mel de forma controlada, de modo a se formarem muitos cristais pequenos, obtendo um mel que muita gente prefere por ser igualmente saboroso e mais fácil de usar. Um processo há muito usado, a patente foi registada em 1935 por Elton J. Dyce. Era assim que aquele mel era produzido, nada lhe tinha sido adicionado. Tinha apenas sido cristalizado.

Googlando encontrei logo instruções para fazer este mel cremoso. Bastava misturar bem 10% do melhor mel cremoso que encontrasse, com 90% do mel fluido que desejava cristalizar, pôr em lugar fresco e esperar. Os cristais que se adicionam induzem a cristalização e vão determinar a forma dos cristais que se vão formar. Assim fiz, usando os pacotinhos que tinha trazido de Copenhaga. Coloquei num local fresco e duas semanas depois tinham um frasco de mel cremoso.

mel4.jpg

Uns dias depois no supermercado, vi que há à venda mel cremoso produzido cá pela SerraMel. Um óptimo mel cremoso de flores de laranjeira. Saboroso e com uma óptima textura, bem sedosa. É esse que uso agora quando quero um bom mel cremoso.

mel2.jpg


Gráfico com a composição do mel DAQUI


Post inicialmente publicado no blog Assins & Assados

sábado, 4 de junho de 2016

Química na Arte XXXVI




Carbono-lição

Agregado
de modos
diferentes,
tu, carbono,
és quase
concreto
ilusão.
Grafite,
camadas
diamante
cruzadas,
resistente
duração.
Tua virtude
maior:
Fazer muita
ligação.
Para nós...
uma lição!...

João Paiva

Ilustração de Afonso Paiva

quinta-feira, 2 de junho de 2016

O MSG é mau para nós?

Peter-Barham-470x500.jpg


Acabei de ler uma entrevista com Peter Barham, um físico inglês da Universidade de Bristol e uma das questões que lhe puseram relacionava-se com o facto do MSG* ter efeitos negativos para a nossa saúde.  Como tenho reparado haver muitos equívocos a propósito deste assunto, achei importante colocar aqui a resposta. Já agora, a leitura da entrevista pode ser interessante.
 
 
O MSG é mau para nós?
Devido a bastante má imprensa, que não tem fundamento, muitas pessoas acreditam que o glutamato monossódico (MSG) é de alguma forma prejudicial. Há bastantes pessoas que lhe vão dizer que são alérgicas ao MSG - referem que lhes dá dores de cabeça e de estômago. No entanto, na verdade, não há casos conhecidos de alguém realmente ser alérgica a MSG. O mito teve origem num médico nos EUA que reparou que vários dos seus pacientes que relatavam ter dores de cabeça e dores no estômago tinha comido comida chinesa pouco antes dos sintomas ocorrerem. Fez então uma dedução
lógica intuitiva que o levou a tirar conclusões totalmente erradas. Adiciona-se MSG à comida chinesa; comer comida chinesa dá dores de cabeça e de estômago; por conseguinte, o MSG causa estes sintomas. Ignorou totalmente os grandes quantidades de MSG que estes pacientes comiam noutros produtos alimentares a que não tinha sido adicionado MSG. Existem grandes quantidades de MSG em queijos - nomeadamente no queijo parmesão onde pode até sr visto a olho nu - as manchas brancas são em grande parte cristais de MSG. Embora pareça verdade que algumas pessoas têm algum tipo de reação à comida chinesa, é simples de demonstrar que esta não é devido ao MSG. Várias experiências foram realizadas em que a pessoas que sofrem desta síndrome foram dadas refeições chinesas sem adição de MSG e relataram os sintomas e, em seguida, dada uma refeição italiana com muito MSG e não relataram quaisquer efeitos prejudiciais.

* Glutamato monossódico, também conhecido como glutamato de sódio. Um dos compostos responsáveis pelo gosto umami.

Foto DAQUI

Post adaptado de um publicado inicialmente no blog  Assins & Assados